Saberes (e sabores) guardados: as receitas de uma mestre griô

Em cardápios de restaurantes, na razão de ser das casas de bolos, nas capas de livros de culinária e nos salões das confeitarias, a alusão a uma cozinha de antigamente, caseira e singela, torna-se cada vez mais frequente. É tanto “marketing da saudade” que, às vezes, duvido que saibamos dizer ou identificar o que seria de fato “comida de avó”. Que comida, afinal, era essa e quem era essa avó imaginária e fofinha, de mão cheia para cozinhar, que preparava receitas vigorosas como se seguisse, sem saber, o estilo da slow, comfort food?

Certamente, essa avó inspiradora existiu, mas a figura que fazemos (e vendemos) dela hoje parece confusa. Em primeiro lugar, o trabalho dela, de tão trivial e tão parte de suas obrigações como mulher e dona de casa, nunca foi valorizado como deveria: passou batido por décadas e décadas, escondido sob o mandamento do “lugar de mulher é no fogão”. Em segundo, as receitas dessa avó, de simples, só tinham mesmo a maneira como a enxergaríamos hoje, de nossas cozinhas limpas, equipadas com a facilidade de liquidificadores, batedeiras e ingredientes comprados no supermercado.

A mineira Lucília Francisca de Souza sabe bem o que é “comida de avó”, e do jeito mais puro e inconsciente: ela sabe prepará-la, do mesmo jeito automático de quem canta uma cantiga que decorou na infância. O depoimento que ela deu ao Museu da Pessoa, cheio de detalhes sobre sua prática na cozinha, é tão saboroso que achamos importante dedicar a ele uma “coleção” inteira – é, na verdade, uma coleção em construção, que pretendemos alimentar com outras séries dedicadas a mulheres que representam memórias vivas de modos de fazer que já andam distantes do dia a dia culinário das grandes cidades.

Em três vídeos, dona Lucília fala com orgulho da trabalhosa “comida de avó”, que ela continua a fazer à moda antiga, como ensinou sua mãe. Não só as receitas, mas também as rezas de benzedeira (sua profissão) e as cantigas de roda, que foi aprendendo ao longo da vida, ela faz questão de “passar para frente”, “porque senão a gente morre, aquilo acaba”.

  • No primeiro episódio, apresentamos a mestre griô dona Lucília e ela nos apresenta às quitandas e à famosa queca, bolo tradicional da região de Nova Lima.
  • O segundo é dedicado ao biscoito de vento, que não tem nada a ver com o biscoito de polvilho que conhecemos em São Paulo. É “ocado”, explica ela.
  • Fecha a série o vídeo em que ela fala do complicado doce de (60) laranjas, e mostra, sem querer, como as receitas se equivalem às cantigas de roda na cultura popular.

 

Outras coleções do Lembraria para o Museu da Pessoa:

 

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24 comentários Adicione o seu

  1. Caroline disse:

    Olá Vivis! Lendo (e escutando a Viviane Zandonadi no Questão de Gosto) nao pude deixar de lembrar disso: https://youtu.be/NDxeYJCzMHI
    Poesia em mineirês.
    🙂

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    1. Carol, que coisa mais linda é essa? Obrigada. Fiquei muda e emocionada.

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